O USO DA PRERROGATIVA DE SANEAMENTO PELO PREGOEIRO

INTELIGÊNCIA EM LICITAÇÕES

[1] “Não se pode definir previamente ou pretender regular o direito-dever de saneamento, até porque são ilimitadas e multifacetadas hipóteses em que ocorrem erros, defeitos, vícios. Acresce-se, ainda, que toda teoria jurídica de convalidação do ato administrativo na riqueza que só a prática evidencia fica distante de um norte permanentemente orientador (FERNANDES, Jorge Ulysses Jacoby. Sistema de registro de preço e pregão presencial e eletrônico. 5ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013)


A Lei Federal nº. 8.666/93, art. 43, §3º, prevê que é facultada à comissão ou autoridade superior, em qualquer fase da licitação, a promoção de diligência destinada a esclarecer ou a complementar a instrução do processo, vedada a inclusão posterior de documento ou informação que deveria constar originariamente da proposta”.

No mesmo sentido vai o Decreto Federal nº 10.024/2019 (art.47), que afirma que “o pregoeiro poderá, no julgamento da habilitação e das propostas, sanar erros ou falhas que não alterem a substância das propostas, dos documentos e sua validade jurídica, mediante decisão fundamentada, registrada em ata e acessível aos licitantes, e lhes atribuirá validade e eficácia para fins de habilitação e classificação, observado o disposto na Lei nº 9.784, de 29 de janeiro de 1999.”

As possibilidades do uso da prerrogativa de saneamento são inúmeras, razão pela qual possui razão o nobre professor Jacoby Fernandes ao afirmar que tais hipóteses são ilimitadas e multifacetadas, não se podendo prever em um regulamento todos os casos aplicáveis. Importante dizer que, [2] por se tratar de uma prerrogativa do Pregoeiro, a realização de diligência pode se ocorrer em um procedimento licitatório independentemente de previsão no Edital, como bem pontua o professor Ronny Charles.

A importância no uso da prerrogativa de saneamento é tanta que o professor Marçal Justen Filho salienta que [3] “a realização de diligência não é uma simples “faculdade” da Administração, a ser exercitada segundo o juízo de conveniência e oportunidade. A relevância dos interesses envolvidos conduz a configuração da diligência como um poder-dever da autoridade julgadora. Se houver dúvida ou controvérsia sobre fatos relevantes para a decisão, reputando-se insuficiente a documentação apresentada, é dever da autoridade julgadora adotar as providências apropriadas para esclarecer os fatos.”

Assim, a não realização de diligência, em face da constatação de sua obrigatoriedade, dependerá de decisão motivada, na qual o agente público deverá explicitar as razões e fundamentos que o levaram a quedar-se inerte ante a constatada necessidade em diligenciar. Temos que ter em mente que os procedimentos licitatórios são meios utilizados para consecutar a realização do interesse público, e não podemos dispor livremente do interesse público (princípio da indisponibilidade do interesse público) sob pena de responsabilização. Logo, se o êxito da licitação depender do uso da prerrogativa de sanear falhas ou erros que não alterem a substancia de documentos e tampouco afetem sua segurança jurídica, essa prerrogativa, de fato, será obrigatória.

O Tribunal de Contas da União tem diversos julgados sobre esse tema, e, para encerrar essa abordagem, compartilho abaixo alguns.

1

Rigor formal no exame das propostas dos licitantes não pode ser exagerado ou absoluto, sob pena de desclassificação de propostas mais vantajosas, devendo as simples omissões ou irregularidades na documentação ou na proposta, desde que irrelevantes e não causem prejuízos à Administração ou aos concorrentes, serem sanadas mediante diligências.

Acórdão 2302/2012-Plenário | Revisor: WALTON ALENCAR RODRIGUES

2

É adequada a diligência efetuada para esclarecimento de atestado de capacidade técnica.

Acórdão 747/2011-Plenário | Relator: ANDRÉ DE CARVALHO

3

É irregular a desclassificação de proposta vantajosa à Administração por erro de baixa materialidade que possa ser sanado mediante diligência, por afrontar o interesse público.

Acórdão 2239/2018-Plenário | Relator: ANA ARRAES

4

A inabilitação de licitante em virtude da ausência de informações que possam ser supridas por meio de diligência, de que não resulte inserção de documento novo ou afronta à isonomia entre os participantes, caracteriza inobservância à jurisprudência do TCU.

Acórdão 918/2014-Plenário | Relator: AROLDO CEDRAZ

5

Não cabe a inabilitação de licitante em razão de ausência de informações que possam ser supridas por meio de diligência, facultada pelo art. 43, § 3º, da Lei 8.666/1993, desde que não resulte inserção de documento novo ou afronta à isonomia entre os participantes.

Acórdão 2873/2014-Plenário | Relator: AUGUSTO SHERMAN

1. FERNANDES, Jorge Ulysses Jacoby. Sistema de registro de preço e pregão presencial e eletrônico. 5ª ed. Belo Horizonte: Fórum, 2013.

2. TORRES, Ronny Charles Lopes de. Leis de Licitações públicas comentadas – revista, amp. e atualiz. 11. Ed – Salvador: Ed. Juspodivm, 2021, 1.138.

3. JUSTEN FILHO, Marçal. Comentários à Lei de Licitações e Contratos Administrativos: Lei 8.666/93 – 18. ed. rev., atual. e ampl. – São Paulo: Thomson Reuters Brasil, 2019, pag.1.013.

BERNARDO – PREGOEIRO, CONSULTOR E PALESTRANTE EM LICITAÇÕES E CONTRATOS ADMINISTRATIVOS

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